Projeto ‘Casa do Mel’ combina preservação ambiental e crescimento econômico para tornar Vale do Rio Doce pólo exportador de ‘mel orgânico’.
A produção de mel é a nova aliada da conservação da Mata Atlântica para 500 pequenos produtores rurais do Vale do Rio Doce. A partir do projeto Casa do Mel, desenvolvido nos últimos dois anos pelo Instituto Terra, ONG ambiental estabelecida em Aimorés-MG, os produtores agrícolas de 12 municípios da região, entre os Estados de Minas Gerais e Espírito Santo, estão explorando a apicultura como uma nova alternativa de renda e uma atividade sustentável, com base em técnicas agroecológicas de produção.
O projeto só foi possível com a cooperação internacional do Governo da Emília-Romagna e da Legambiente, uma das mais importantes associações ambientais da Itália. Participaram também como parceiros o Sebrae – Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas de Minas Gerais e do Espírito Santo e a Prefeitura Municipal de Colatina.
A iniciativa da Casa do Mel serviu de estímulo para a modernização e reorganização da atividade da apicultura na região atendida, promovendo um incremento da produção do mel e seus derivados, estabelecendo uma fonte de renda adicional para as famílias rurais e ajudando a reduzir os índices de êxodo rural.
O projeto Casa do Mel envolveu, desde 2009, apicultores de sete municípios da microrregião de Aimorés – Aimorés, Itueta, Santa Rita do Ituêto, Resplendor, Mutum, Conselheiro Pena e Pocrane -, bem como dos municípios de Baixo Guandu, Colatina (Itapina), Laranja da Terra, Brejetuba e Afonso Claúdio, no Estado do Espírito Santo.
Preservar e produzir – Pescador que buscou na atividade da apicultura uma alternativa de renda, Antônio Luiz Marques Rios é um dos participantes do projeto Casa do Mel. Ele conta com três apiários instalados em propriedades de terceiros na região de Aimorés e sabe da importância da preservação ambiental para a atividade.
Dois dos apiários do apicultor tem na Aroeira a principal espécie explorada, mas, neste caso, a florada ocorre apenas uma vez por ano. Das caixas que Antônio Luiz têm instaladas perto do rio – onde existem mais espécies florestais que florescem o ano inteiro – é de onde obtém maior produção atualmente. “E a partir dos encontros no Instituto Terra, com as palestras e a troca de experiência com outros apicultores, iniciei melhorias em meus apiários e tomei conhecimento das espécies que podem florescer o ano inteiro. Estou plantando algumas delas para aumentar minha produção”, conta o apicultor.
Se o impacto socioeconômico é evidente, a apicultura soma importantes benefícios também do ponto de vista ambiental. “Consorciar a apicultura com outras atividades já exercidas por pequenos e médios produtores tem levado a uma nova visão a respeito da conservação de reservas florestais, apontando mais um caminho para incentivar as Áreas de Proteção Permanente e de Reserva Legal”, explica Adonai Lacruz, superintendente Executivo do Instituto Terra.
Lacruz destaca ainda outro fator importante ligado à biodiversidade e que é pouco divulgado junto aos produtores. “Com o incremento da apicultura temos o aumento da polinização em culturas agrícolas, com consequentes ganhos de produtividade e de qualidade, além da sua importância para as demais espécies vegetais, contribuindo para a preservação de muitas plantas que poderiam entrar em processo de extinção – pois em muitas regiões há uma sensível redução no número de animais polinizadores”.
Mel ‘ecológico’ de olho no mercado internacional
“Queremos promover pradões internacionais ao mel produzido na Mata Atlântica para torná-lo um competidor no circuito do comércio de produtos ecológicos”, destaca o presidente da Legambiente, Lorenzo Frattini, parceiro do Instituto Terra no projeto Casa do Mel. Para isso, o projeto articulou a construção de um entreposto e de uma unidade de processamento com capacidade para 300 quilos de mel por dia. A partir desse novo espaço, pretende-se melhorar a qualidade e apresentação do produto final, com vistas a atingir até mesmo o mercado internacional.
O entreposto está sendo construído em Colatina (ES), em área do Instituto Federal de Educação (Ifes), a partir de investimentos da Prefeitura Municipal e do Governo do Estado do Espírito Santo – através da Secretaria de Estado da Agricultura. Os equipamentos necessários estão sendo fornecidos pelo Instituto Terra, a partir dos recursos previstos no projeto Casa do Mel.
O município de Colatina foi o escolhido tendo em vista sua localização estratégica dentro da área de abrangência do projeto no Vale do Rio Doce, permitindo atender um maior público – mais de 30 municípios onde a apicultura tem potencial de expansão. A intenção é que a unidade sirva de referência para apicultores do norte capixaba e leste de Minas Gerais, beneficiando mais de 380 apicultores, através do processamento padronizado e certificado de qualidade. Somente em Colatina são cerca de 40 pessoas envolvidas na produção do mel, e uma produção anual de aproximadamente 30 toneladas, que atende ao mercado interno e externo.
Saiba Mais
O Mercado da Apicultura – A apicultura é uma atividade em ampla expansão no Brasil, que oferece boas condições para a criação de abelhas em todas as suas regiões. No entanto, devido ao fato de também sofrer com os efeitos da política macroeconômica, principalmente com a elevação dos juros, com as flutuações da taxa de câmbio e com a retração dos preços internacionais, o apicultor brasileiro terá maior dificuldade nos próximos anos para competir com o produto chinês e argentino, benefici ados por uma política cambial pró-exportação e pela inserção privilegiada nas redes do comércio internacional do mel natural. Portanto, agregar valor “orgânico e ecológico” ao mel brasileiro e seus derivados pode significar uma importante para conquistar o mercado externo, principalmente o Europeu, criando um verdadeiro selo de identificação para o mel da Mata Atlântica.
Recuperação ambiental – O projeto Casa do Mel se constituiu em mais uma iniciativa do Instituto Terra visando recuperar a Mata Atlântica no Vale do Rio Doce. A região era originalmente coberta por florestas pertencentes a esse bioma rico em biodiversidade. Porém, o processo de colonização, a exploração da madeira e práticas agropecuárias sem nenhuma preocupação com a conservação e o manejo do solo provocaram o desmatamento generalizado, gerando impactos ambientais (como erosão do solo e escassez de água) e socioeconômicos (a baixa produtivida de agrícola e a falta de oportunidade tem levado jovens e produtores rurais a se deslocarem para os grandes centros a procura de emprego). A apicultura, como atividade econômica profissional, foi identificada como uma das potencialidades a serem desenvolvidas na região, onde se busca alternativas de produção sustentável, que venham gerar oportunidade de emprego e renda, diminuindo o êxodo rural e revertendo o quadro de baixa sustentabilidade ambiental verificada atualmente na região.